Cada som em cada movimento provocava
o mistério daquela tarde, naquele dia pendurado à noite. O mistério daquilo que
estava e não se via nem se servia dos olhos para ser visto.
As pedras dobradas e ancoradas na
ponta do mar. As árvores estendidas no chão.
As folhas acordadas e sonhadas param
e recomeçam o tempo. O olhar manifesto nas mãos recolhe-as para fora, cada uma
a seu tempo. Desdobra o corpo mais uma vez e lança a seta onde o alvo não figura,
nem silhueta tem. A seta deixa de ser seta, o alvo deixa de ser alvo, o arco recolhe-se
em ar. Vai para dentro do corpo através das mãos.
O sol a atingir os raios, a luz a mover
as sombras. Faz mover os pés para junto do corpo. Abana e abandona a árvore onde
te seguras. Planta-te a ti, no mais profundo que há em ti e no interior da terra.
Bem lá no fundo e vem. Faz-te árvore e toca as nuvens com os teus ramos e toca as
nuvens com as tuas raízes.
O movimento só é liberto depois de o
soltares, de ti e ao que te prendes-te.
Arranha e arranca a respiração do teu
corpo e da tua alma, faz-te surdo ao mundo para te escutares. Senta-te ao teu colo
e faz-te criança. Assim chegarás a ti.
E agora o vento preso pelas árvores solta
as folhas. Uma a uma. Passo a passo. Tudo regressa a ti. O que te esqueces-te, o
que perdes-te, o que tapas-te, o que enfeitas-te. Está tudo agora no dobro da intensidade.
Vai-te lixar.
2 comentários:
Simplesmente lindo. Cada palavra, cada frase, sutil e arrebatadora, pura poesia, puro sentimento, minha alma ainda ri de alegria, após essa leitura!
Parabéns!
agradeço!
Enviar um comentário